segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Capítulo 7: ele.

No primeiro gole de cerveja, quase como um pretexto, ele vinha à cabeça. Sempre ele, não outro. Sempre da mesma forma, doce e ardente, cheio de ternura e desejo. Flora disfarçava, falava sobre outras coisas, tentava tirá-lo do pensamento, mas nunca conseguia. Estranho, porque Flora nunca foi “dessas” obsessivas ou apaixonadas desmedidas. Sem contar que já fazia um tempo que seu coração vivia no conforto de águas mornas e calmarias.

Para assumir a intensidade deste desejo ela precisaria se mudar e mudar. Porque por mais que ele morasse em um país próximo, era um outro país: uma nova cultura, novos amigos, novas leituras... uma nova vida. E por mais que há tempos desejasse uma mudança, ela não tinha certeza se era essa a hora da mudança; também não sabia se suportaria tantas mudanças.

Flora já tinha vivido o suficiente para saber que toda vez que atrelava as mudanças que queria fazer na vida a alguém não dava certo. Ninguém consegue mesmo suportar o peso-responsabilidade de mudar a vida de uma pessoa, de mudar a vida dela. Logo a dela, uma mulher aparentemente forte. E, por mais que ela soubesse que ele não era “o” motivo, ele era sim O motivo: o mais evidente, o que fazia ela pulsar e querer romper, ser e fazer diferente.

Maldito terapeuta que um dia a convenceu que não deveria tomar atitudes precipitadas! Maldito, principalmente, porque esqueceu de ensiná-la a reconhecer quando algo era mesmo precipitado ou não. Maldita filha que fazia sempre ela ter que ser consequente. Maldita história que a jogou num horizonte tão enclausurante quanto é enclausurado pelas suas próprias expectativas. Mais uma vez, maldito terapeuta (sempre o terapeuta!) que lhe disse que o mecanismo de defesa das pessoas inteligentes era a racionalização. Maldita Flora, que se julgava tão inteligente. A vontade dela era gritar, se libertar. E ela, simplesmente, saiu para trabalhar.

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